"Silêncio Denunciado"
1. Como surge a ideia de escrever este
seu último livro Silêncio Denunciado?
A
ideia surge numa forma de repensar a literatura como figura interventiva. Há já
algum tempo que comecei a ler os textos publicados nos dois últimos livros e
denotei inconscientemente textos que denunciam algo que, na minha forma de
estar na vida, são completamente irreais…
se assim posso chamar…
2. O que é que este livro traz de novo
ou de particular comparativamente aos outros livros que já publicou?
Traz
um tudo e um todo. Começa por ser uma única narrativa ao invés de várias como
constam nos livros anteriores. No entanto, se eu refletir melhor, o livro Silêncio Denunciado também pode ser
visto como tendo várias narrativas, uma vez que os seus capítulos, embora com um
sequência lógica, revestem vários males das várias sociedades. E, é
precisamente devido à sua sequência lógica que o livro Silêncio Denunciado acaba por fazer parte do universo literário
romancista.
3. Que novos desafios enfrentou ao
escrever Silêncio Denunciado?
Alguns!
O maior foi, talvez, a estrutura da obra em si. Sabia que queria escrever sobre
todos os males que habitam no mundo, mas, sabia ser impossível, assim, acabei
por dedicar-me àqueles que mais me tocam em particular, talvez pela forte
presença, ainda, destes males nas várias sociedades. No entanto, também, não
posso deixar de denunciar que, vestir o papel de uma personagem que se revê em
várias foi o maior desafio. Queria que o livro fosse intenso, provocasse emoção
e, ao mesmo tempo, não queria desenvolver muitas personagens, logo, teria que
estruturar muito bem a obra, de forma a que o leitor quando a fosse ler,
percebesse que uma única personagem poderia representar várias, sendo ela
própria divisível através da
procriação…por outro lado e, como é evidente, acabei por abraçar da(s)
personagem (ns), aquela dor mais acentuada. Aquela que todos sabem que existe,
mas calam…
4. Como está estruturada a obra?
Como
referi, a obra está estruturada por capítulos que antevê uma narrativa formada
por uma sequência lógica na história apresentada. Cada capítulo representa um
tema e, em cada tema pode ser facilmente identificado a origem da dor incluída
no próprio tema. Ou seja, existem algumas particularidades na narrativa de cada
capítulo, que antevê se o mesmo se passa, por exemplo, na Índia, na China, em
África, Europa ou, em que Continente a atrocidade em si é mais (in)visível.
Escrevi (in) porque, efetivamente, a atrocidade é visível, mas nós, humanos
teimamos em torná-la invisível.
5. Quais são os personagens principais
de Silêncio Denunciado?
Eu
diria que existem três grandes personagens principais: A mãe de Alma, a Alma e
o pai adotivo de Alma. No entanto e, como referi anteriormente, a Alma
representa em si várias mulheres das várias sociedades, incluindo, como é
óbvio, a sua própria mãe que, apesar de ter sido lapidada foi quem deu corpo à
obra…
6. Qual é a distância (ou proximidade)
entre a autora, a narradora e as personagens, uma vez que por vezes se tornam quase
indistinguíveis nos sentimentos que expressam?
É
natural que a distância seja praticamente nula na maneira de sentir, no
entanto, e, devido à proximidade física ser o reflexo da distância geográfica,
é natural que haja uma certa diferença, uma vez que estou apenas a descrever o
que supostamente sinto, mas não sinto, porque não vivi, realmente, nenhuma das
atrocidades reveladas na obra. Diria que, me aproximo como autora e narradora
dos sentimentos mas, também, me distancio não só geograficamente, mas, porque
apenas suponho sentir o que deveria sentir se vivesse o que narrei…
7. Acha que aquilo que denuncia é
claramente injusto e desumano aos olhos de todos?
Hesitei
muito nesta resposta. Ao princípio pareceu-me bastante lógico responder
afirmativamente. Afinal, somos humanos e a dor alheia faz-me (nos) doer,
também. No entanto e, depois de refletir um pouco percebi que, se fosse
claramente injusto e desumano aos olhos de todos, não haveria a necessidade
desta obra ter nascido. É óbvio, claro e inequívoco que a justiça não é
absoluta, a verdade também não, no entanto, existe um sentimento que é comum e
atrevo-me mesmo a dizer, absoluto, é ele a dor, logo, sendo a dor absoluta,
pese embora sentida de diversas maneiras em diferentes seres, o que é um facto
é que não deixa de ser dor, assim, denunciar as atrocidades que determinados
seres provocam em outros seres, mesmo aqueles que nada fazem mas sabem que
existe, torna-se imperativo, caso contrário, esta obra não teria nascido…
8. Em Silêncio Denunciado aparece
quase todo o tipo de sofrimento por que passam muitas mulheres pelo mundo fora,
descrito através das poucas personagens do livro, sem que se detenha muito com
detalhes geográficos e históricos. Quer com isto dizer que o sofrimento é
universal e que todos temos a nossa quota-parte de culpa nessa partilha silenciosa?
Sem
dúvida! O sofrimento sendo um sentimento é único e universal, também. Todos
temos a nossa quota-parte de culpa em todo e qualquer sofrimento alheio, no
entanto, a ausência de detalhes prende-se, essencialmente, com o facto de eu
querer chamar à razão o que é realmente importante. Receei, confesso, que, os
detalhes aflorassem a obra, tornando-a menos dura e, o que pretendi foi,
precisamente, dar um murro no estômago, denunciar sem falsas modéstias um falso
moralismo, sendo direta, assertiva e consistente.
9. A sua definição de literatura tem
vindo a mudar desde que começou a escrever os primeiros textos?
Sem
dúvida! Pese embora a base esteja lá, o meu cunho pessoal seja
indiscutivelmente inconfundível, o que é certo é que, a minha escrita tem-se
revelado mais acutilante. Desafio-me a ser menos discreta, se é que algum o
fui, pelo menos com as palavras, mas, acima de tudo, desafio-me a ser mais
ofensiva sem ofender, agressiva sem agredir, desafio-me, inclusive, a provocar
as palavras para elas abanarem mentalidades, ou seja, provocar no sentido de
despertar, de desafiar o ser humano, a sua reputação, a sua imagem, tornando-o
frágil, quebrável…
Encontrei
na literatura não uma definição, mas, antes uma revelação, uma nova forma de
agir, ser e estar… atuar interventivamente através da escrita foi o que descobri
em mim sem procurar…
10. Que novos projetos tem em mente?
Tantos
e tão poucos! Muitos e nenhuns…
De
facto, parece um paradigma o que acabei de escrever, mas, a realidade é que
tenho estado imersa em vários projetos, nomeadamente, numa autobiografia, num
livro de citações próprias, numa biografia de uma determinada personagem, num livro de poesia, mas…
enquanto não concluir pelo menos um, posso dizer que estou absorvida em muitos
e em nenhuns ao mesmo tempo e, também, tantos, porque de facto, são alguns,
mas, poucos para o que pretendo ainda fazer…
11. Que tipo de reação antevê dos seus
leitores a este novo livro Silêncio Denunciado?
Esta
é a pergunta mais difícil de responder. Não sei! Talvez uma reação semelhante
às anteriores obras, uma vez que o meu cunho, como já referi, nunca esteve
ausente… mas, acrescento que, a expectativa é alguma…