Iceberg Angola - Discurso de Apresentação

Boa tarde a todos(as)!

E, antes de começar o meu discurso, quero agradecer a Vossa presença neste evento.
Um Obrigada a todos(as) por me apoiarem estando aqui numa quinta feira ao final do dia, por apreciarem o meu trabalho, e por gostarem desta nova faceta da minha Vida que, confesso, tardiamente descobri, por isso e muito mais, o meu Obrigada!

Eu comecei a fotografar há cerca de 2 anos e não fazia a mínima ideia o que me esperava.
Não sou uma fotógrafa profissional, sou uma perfeita amadora, mas, completamente apaixonada pelo que faço. Tudo o que aprendi foi via youtube, muitos clicks fracassados e outros recheados de sucesso, muito treino, persistência, mas acima de tudo, muita paixão e sede de querer aprender sempre mais e mais…

Foi através de um convite de uma grande amiga minha que entrei para estas lides fotográficas, entrei para um projeto de nome “VêSó”, em Angola. Um projeto que visa, essencialmente, criar um registo fotográfico dos bairros (musseques) de Angola, para que as gerações vindouras possam ter um testemunho de como as gerações anteriores viviam.

Comecei com um telemóvel, depois com a câmara emprestada da minha mãe, até que chegou a altura e decidi comprar a minha primeira câmara fotográfica.

E, aos poucos, a minha paixão foi crescendo, e foi crescendo numa direção:
Captar a essência humana, captar a dignidade humana, captar momentos únicos e tão próprios de uma sociedade reduzida a pó, a cinzas, captar a Alma de um povo sofrido, mas sempre com um sorriso nos lábios.

Nunca em momento algum, quando comecei nesta minha “Era” dos clicks, pensei em publicar um livro de fotografia. Mas, o portfólio foi crescendo, o registo fotográfico foi tomando proporções algo inimaginável e, foi de um momento para o outro que nasceu a ideia de publicar algo que acho merece ser partilhado.

Chamar o “Horror da Beleza” a um dos quadros ao qual fiquei em 3ºlugar num concurso fotográfico, lançado pela petrolífera Total foi, também, o mote que deu origem à pergunta: Porque não?

Porque acredito que, em todo o horror consegue-se captar, também, a beleza.

O Livro “Iceberg Angola” revela, como a própria palavra diz, a profundidade de um país, o outro lado de uma Angola que não se vê a olho nu, é preciso saber observar, é preciso desafiar o medo ou o receio, é preciso constatar de alguma forma que essa Angola ainda existe.

Criei uma capa que revela isso mesmo. Um menino que esconde debaixo da sua cabeça o seu corpo (a outra Angola), a boca tapada por uma água escurecida (o petróleo), orelhas a descoberto, porque podemos ouvir, mas devemos ter cuidado com o que falamos. Perfeitamente (a)normal quando se tem o síndrome da guerra.

Captar estes momentos, a vida de um povo sofrido, a essência de um povo subnutrido, mas registar algo que quero acreditar ter os seus dias contados. Quero acreditar que este testemunho em forma de livro seja visto de uma forma crítica, mas construtiva, para que todos nós que fazemos parte desta sociedade, desta aldeia grande a que eu chamo mundo, possamos mudar a vida deste povo, a vida deste e de outros povos, porque não é só em Angola, não é só em África, Ásia está cheia de pobreza recheada de miséria.
É impreterível que façamos algo, é indispensável que as organizações acordem, é urgente que mudemos as nossas prioridades. Os valores humanos estão a perder-se à velocidade da luz, o que importa é a riqueza material, o que de facto interessa é a matéria, quando na realidade não somos mais que meros peões à procura de algo comum. A felicidade!

A prova disso está nesta livro, crianças que nada têm, mas nunca o sorriso lhes falta, pessoas que tudo lhes falta, mas não perdem a esperança de ser felizes, fazem da dança o seu refúgio, dos seus sorrisos as suas casas.

Sorriem, cantam e dançam à luz do céu sem estrelas, com pés descalços de terra batida, atravessando oceanos de esgoto para irem à única casa onde conseguem ter fé. Uma falsa fé, é certo, porque ainda há quem se aproveite da desgraça alheia para enriquecer à conta, mas é assim que eles são felizes, e porquê?

Porque uma nação começa com a educação e essa, essa continua a não ser a prioridade de muitas nações.

E, mais não digo, estaria a desvendar algo que pode facilmente ser visível através do livro “Iceberg Angola”.

Fiquem com o livro “Iceberg Angola” e apreciem o que de belo deve ser apreciado mesmo que o horror ainda nos choque.


Bem hajam!

Ana Mascarenhas

19 Nov 17 


Iceberg Angola - Prefácio

Entre o sonho e a realidade
Entre a inverdade  e a verdade
Entre a liberdade e a vontade
Sonetos veneram a meninice da terceira idade 
Em desapego  a velhice da mocidade

Quando as palavras que o vento leva já cá não estarão 
A correnteza dos tempos e desvaneios da longa procissão 
Novos entes nova canção nesta mesma Nação 
A imagem em foto aqui continuará a cumprir com a sua missão 
Para a memória colectiva de todos os irmãos

Quando acedi ao desafio convite, de Ana Mascarenhas, para em papel deixar a minha leitura/visão do material fotográfico que de forma muito compenetrada ela depositou em minhas mão e disse:

 " Nelson quero que sejas tu a escrever o prefácio deste livro"... Dizia eu, não fazia  noção da empreitada que me havia metido. Contudo, aqui estou idilicamente embriagado, entre palavras e frases a compor e dar sentido a tamanha responsabilidade de dar-vos a conhecer a presente obra.

Como ser indiferente num continente onde as cores quentes do dia-a-dia exalam os mais variados odores, onde o nosso olhar tateia sabores e amores que transportam o nosso imaginário para galáxias cósmicas que de regresso escalamos esta linda terra que é Angola. Em que o sorriso rasgado da criança comprometida com o futuro calcorreia, ainda, o lamaçal da chuva teimosa que lá mais distante fez crescer a fruta que a mãe zungueira comercializa para alimentar os seus. Onde o velho cidadão  viu chegar, de todas as partes, compatriotas seus fugidos da guerra que protelou o porvir da Nação. 

A sensibilidade e a necessidade de inserção de Ana Mascarenhas, enquanto estrangeira, para as coisas da terra leva- a a percorrer e  registar para a posteridade, as mais diferentes realidades deste Pais....

O kandengue do sorriso único sem igual 
A kindumba da zungueira que prende o olhar
A tez envelhecida do velho que anseia melhorar...

Para lá do crescimento, do surgimento de novas urbanizações e do asfalto, ainda, há uma realidade que urgentemente precisa ser revertida. E a fotografia com todo o seu poder, técnica, emoções e capacidade de registar para a posteridade não devera, nunca, usar filtros para somente exaltar o belo e ocultar o menos belo. E é com este olhar de cidadã, mulher, mãe, filha ou irmã  que a neófita Fotógrafa Ana Mascarenhas percorre com a alma e o coração pedaços de nós. Que não escamoteadas, deverão servir de barómetro para o reunir de forças e juntos fazermos desta outra realidade, quanto antes, memórias passadas da nossa recente história. 

Ana Mascarenhas  que no campo literário dispensa qualquer apresentação tem no mercado cinco ou seis obras onde na primeira pessoa denuncia, nos mais variados estilos literários, a violência a segregação e demais atrocidades deste nosso Mundo.

Ana Mascarenhas, nesta nova empreitada, inicia assim um novo trilhar na arte de bem fotografar e o de registar os momentos em imagens.

Ana Mascarenhas a Escritora
Ana Mascarenhas aqui e agora a Fotógrafa! 

Convido-os a acompanhar  e desvendar o que vai para lá da ponta deste Icebergue através do olhar de Ana Mascarenhas

           Nelson Silvestre
        06 de Março de 2017