Prefácio do Livro de Cátia Arnaut "de mala às costas"


Por entre terras e mares que nos separam dos nossos entes queridos, quer por razões profissionais ou por outras, está o nosso “eu” que inicia uma crise de identidade pela qual se debate.

Uma crise de identidade de valores que julgámos serem únicos, uma crise de identidade cultural, pessoal, social, profissional, enfim… a nossa identidade que até então conhecemos como única começa a ser testada e a ser desafiada em cada experiência que por nós atravessa.

Mas, são estas experiências que nos fazem crescer. Crescemos como pessoas, crescemos interiormente, crescemos e respiramos de forma diferente.

É isto que a Cátia nos mostra nas suas news letters.
A Cátia tem o Dom de nos presentear com a alegria quando tudo parece desmoronar e tem a capacidade de dar a volta por cima quando tudo parece desabar.

Atravessar o mundo, derrubar fronteiras, desmistificar culturas, desbravar sensações que são únicas porque são igualmente ímpares as suas experiências, são a maior riqueza que o ser humano leva consigo nesta que é a mais curta viagem de uma vida.

Pequenas experiências relatadas pelas mãos da Cátia demonstram que o mundo é pequeno, mas ao mesmo tempo enorme nos seus caminhos cruzados, que refletem o que de melhor a vida tem, os afetos.

A Vida não é fácil e a de expatriada muito menos, viver fora da nossa zona de conforto e ainda por cima com uma filha bem pequena não é de todo tarefa para qualquer pessoa, é preciso ter uma grande dose de bagagem para poder ter a coragem que a Cátia tem. Mas, são as pessoas que vamos conhecendo ao longo das várias estadias por onde passamos que nos vão dando forças e, são também através das amizades que vamos criando que vamos igualmente criando novos laços familiares, e é aqui que aprendemos o verdadeiro significado da palavra afeto.

O afeto por terras angolanas como a Cátia relata é um afeto verdadeiro, sem segundas intenções, o abraço ou o Kandandu como lhe chamam, é um dos afetos mais puros e sentidos por estas terras, por outro lado, não há calor mais humano que o calor africano, este povo que cresceu e cresce com a dor, continua a ter amor para dar, continua a ter afetos para nos ensinar.

Obviamente que existe o outro lado, mas como em qualquer outra parte do mundo aprendemos a viver com o bom e o menos bom.

Aprendemos também o outro lado da dor, o lado da perda dos amigos que partem para outras paragens antes de nós. A vida de expatriado é isto mesmo. Aliás, como aconteceu com a Cátia, primeiro Dubai, depois Angola e agora novamente Portugal. Deixamos amigos, e deixamos a nossa nova zona de conforto criada para o efeito. Esta é a vida de emigrante, esta é a vida que por umas ou outras razões escolhemos como sendo a nossa vida, mas é a vida de pequenos confortos que vamos criando que faz com que desafiemos o nosso “eu” a sair dessa suposta zona quando necessário for.

E é assim que verificamos que o que de melhor temos nesta vida não são os bens materiais, não é a casa onde vivemos ou o carro que andamos, também não é o trabalho porque não é eterno, mas, são os laços que criamos com as pessoas que conhecemos, são os afetos que partilhamos e os momentos que criamos, porque esses são nossos e nem mesmo o tempo os consegue tirar, nem o tempo nem ninguém, porque já os vivemos, já os sentimos, já os cheiramos, já nos consciencializamos que os momentos são únicos porque nossos e isso, garanto-vos, a Cátia vive-os bem, ensinou-me também a vivê-los e com ela tenho aprendido a saber o que é de facto Viver com vontade de Viver, a saborear cada momento e cada pedaço de tempo. Ensinou-me algo muito importante também, ensinou-me a viver os momentos disfóricos da mesma forma como vivo os eufóricos, a saborear as lágrimas e a tristeza da mesma forma que saboreio o sorriso e a alegria, é importante sabermos sentir tudo de todas as maneiras.

A Cátia traduz nas suas news letters muito bem esse sentir, essa revolta, esse grito calado, que é tão importante como a gargalhada ou simplesmente o sorriso com vontade de sorrir.

A vida de expatriada como relatei anteriormente não é fácil, e mais difícil é com uma criança, mas, se soubermos usar a nossa energia e canalizá-la de forma correta, se soubermos que a vida é feita de momentos e os momentos devem ser preenchidos essencialmente com afetos, então sim, a vida de expatriada torna-se no conforto em qualquer parte do mundo, porque a zona de conforto passa a ser simplesmente o nosso “eu”, a nossa Alma e o nosso sentir.


Ana Mascarenhas
26 Novembro 2016